segunda-feira, novembro 30, 2009

Quem nunca escutou (ou disse) essas palavras...?



...que atire a primeira pedra!

sábado, novembro 28, 2009

Eu era o assunto

Durante muito tempo, costumava deitar-me cedo. Às vezes, mal apagava a vela, meus olhos se fechavam tão depressa que eu nem tinha tempo de pensar: adormeço. E meia hora depois, despertava-me a ideia de que já era tempo de procurar dormir; queria largar o volume que imaginava ter ainda nas mãos e soprar a vela. Durante o sono, não havia cessado de refletir sobre o que acabara de ler, mas essas reflexões tinham assumido uma feição um tanto particular. Parecia-me que eu era o assunto de que tratava o livro: uma igreja, um quarteto, a rivalidade entre Francisco I e Carlos V. Essa crença sobrevivia alguns segundos ao despertar. Não chocava minha razão, mas paraiva-me como um véu sobre os olhos, impedindo-os de ver que a luz já não estava acesa. Depois começava a parecer-me ininteligível, como após a metempsicose, os pensamentos de uma existência anterior. O tema da obra destacava-se de mim, ficando eu livre para adaptar-me ou não a ele. Em seguida recuperava a vista, atônito de encontrar em derredor uma obscuridade, suave e repousante para os olhos, mas talvez ainda mais para o espírito, ao qual se apresentava como algo sem causa, incompreensível, algo de verdadeiramente obscuro. Indagava comigo que horas seriam. Ouvia o silvo dos trens que, ora mais, ora menos afastado, e marcando as distâncias como o canto de um pássaro em uma floresta, descrevia-me a extensão do campo deserto, onde o viajante se apressa em direção à parada próxima: o caminho que ele segue vai ficar gravado na lembrança dele com a excitaçáo produzida pelos lugares novos, os atos inabituais, pela recente conversa e as despedidas trocadas à luz de lâmpada estranha que ainda o acompanham no silêncio da noite, e pela doçura próxima do regresso.

(Em busca do tempo perdido, Marcel Proust: No Caminho de Swann - Tradução Mario Quintana).

segunda-feira, novembro 23, 2009

As histórias de cada um

Toda vez que alguém conta a sua própria história, por mais que vc conheça o histórico dessa pessoa, sendo ela dramática, fantasiosa, sonhadora, oportunista, etc., soa diferente. Seja como for, o fato é que quando essa pessoa está contando a história dela parece que ela se desprende de todos os adjetivos passados e amarras: abre-se (do céu) um foco de luz que a ilumina por inteiro, como se ao redor do ouvinte nada mais tivesse vida ou importasse. E o ouvinte vai se reconhecendo nas passagens, vai se emocionando com as histórias, ele compra o peixe. Há quem diga que o verbo não tem mais força e que não se deve levar ao pé da letra tudo o que é dito. Eureka: existem as entrelinhas! Muitos defendem que faz parte da inteligência emocional do ser humano saber ler essas entrelinhas. Aliás, dizem até que Deus é verbo.

É justamente no limite dessa confusão humana do querer e ter é que as palavras se esquecem...Se eu pudesse escolher um 'verbo padrão' para ser a base das relações humanas, eu escolheria o verbo acreditar. O duvidar dói tanto. Parece que toda hora, todo dia, morre um pedaço da crença. O amor sozinho não sustenta o edifício das outras necessidades vitais. É preciso esforço: vontade de ser mais do lado do Outro. Vontade também de acentuar essas qualidades buscando conhecimentos de graduação. O amor não está só no 'poder prover'. Tem alguma coisa ali de paciência nele, de carinho ao ver o Outro em posição inferior. Amor é esclarecer o que não se sabe com bondade e respeito.

Eu acredito no verbo porque me comunico através dele. Aliás, escolhi a comunicação como dever de casa para a vida. Mesmo assim, confesso, que nem sempre compreendo bem essas malditas entrelinhas. Mas quem entende? Parafraseando o moço da capa voadora:"Para o alto e avante!" E assim vivemos.

sábado, novembro 07, 2009

Quem conta um conto...


No centro do jardim crescia uma roseira carregada de rosas e, à sua sombra, vivia um caracol que tinha muito dentro de si – aliás, literalmente falando, tinha mais dele mesmo.

- Paciência! – dizia o caracol. Há de chegar a minha hora. E vou fazer muito mais do que dar rosas ou avelãs, e mais ainda do que dar leite como fazem as vacas e as ovelhas.

- Espero muito de você, Caracol. – dizia a roseira. Aliás, acho que cabe aqui uma pergunta bem pessoal: quando você vai poder me mostrar o que realmente é capaz de fazer?

- Calma! – respondeu o caracol. Você é sempre tão apressada, Roseira. Não é assim que se preparam as boas surpresas.

Um ano mais tarde, o caracol estendia-se ao sol quase no mesmo lugar onde estivera no ano anterior, enquanto a roseira se afadigava em criar novos botões e a manter todas as rosas. O caracol pôs meio corpo fora da carapaça, estendeu os pauzinhos e voltou a recolhê-los.

- Nada de novo – disse o Caracol. Não se vislumbra progresso algum.

Passou o Verão e chegou o Outono. E a roseira continuou a dar novos botões e novas rosas. Até que a neve começou a cair e o tempo ficou húmido e frio. A roseira dobrou-se sobre a terra e o caracol escondeu-se no solo.

(Hans Christian Andersen in fragmentos do conto O Caracol e a Roseira).

domingo, novembro 01, 2009

Toda ouvidos

Le rouge